quinta-feira, janeiro 27, 2005

O Erro de Damásio (3)

A história é conhecida: Tristão e Isolda bebem uma poção (secretamente preparada por Brangena) que os arrasta para uma paixão, um êxtase, que não conseguem controlar. António Damásio considera que Richard Wagner, compositor da ópera Tristão e Isolda, se sentiu atraído por esta história porque ele próprio foi vítima de uma paixão «não menos insensata». E porquê insensata? Porque, ainda de acordo com Damásio, Wagner era casado; e a amante, Mathilde Wesendonk, era a mulher do «generoso» benfeitor do compositor...

A isto chega a sobranceria moral do neurologista da Universidade de Iowa; o seu quadro mental formatado no preconceito. Sigamos a tese: no nosso organismo, a oxitocina pode funcionar como uma espécie de filtro do amor – como a poção preparada por Brangena – e induzir-nos a comportamentos ínvios; mas que podemos ser capazes de eliminar «através da chamada força de vontade».

Wagner, portanto, comportou-se como se os ensinamentos de Descartes fossem verdadeiros: porque não teve em conta a premissa de que só pensamos porque existimos. Estava nas mãos de Wagner, como se vê, evitar que o seu «generoso benfeitor» ganhasse apêndices na córnea. Mas não: foi insensato e cedeu à paixão; permitiu-se seguir o desejo; arrogou-se o direito de pensar que podemos amar sem ficarmos atados à oxitocina.

Se António Damásio fosse o mentor da Seita de Fénix, a masturbação estava dependente de as batermos exclusivamente à mor da parceira que escolhêssemos, de modo responsável, para partilhar o melhor de toda uma vida. Como adiante se verá quando se falar do arganaz – esse roedor com quem todos, todos, devíamos aprender.