quinta-feira, outubro 20, 2005

O erro

O erro é esse: pensar que o amor pode ser uma coisa simples, sem entregas absolutas, sem necessidade de descer aos poços escuros quando o Inverno ou a vida desabam sobre nós – descer ao fundo do poço para depois regressamos, feridos, se regressarmos, e termos uma luz, uma luz precária que seja, para oferecer à pessoa a quem jurámos o amor: o amor absoluto. (Riam, riam.)

O amor ou é tudo ou é nada, nadinha, nadegues. Por isso tinha razão o, o, o, como é que ele se chama? O Vinícius, que escrevia umas coisas apaneleiradas a ver se mantinha uns ocasionais encabanços. Mas tinha razão: curto que seja no tempo, imortal o seja enquanto dure. Depois, em amolecendo, fora. Sem subterfúgios.

Eu, por exemplo, à mocinha de línguas que na terça-feira me recitava Elliot a respirar pelas guelras, agradeci-lhe a punheta – e ela ficou sem perceber porque não percebe que a questão não é a da forma mas, digamos, a do conteúdo, e que aquilo não passara duma pívia mal arregamanteada.

Se a amasse ainda lá estava hoje, nem almoçava, nem saía de casa, a beijar-lhe os pés e a fechar à chave o gabinete da estante dos livros. (Mentira: isto sou eu a falar.)