sexta-feira, dezembro 31, 2004

Geografia

Perguntam-nos por mail (aseitadefenix@hotmail.com) se há algum critério especial a ter em conta na escolha da festa do fim de ano. Bem: nós, hoje em dia, verdade verdade, festas só na piça; mas sempre se adiantará que o critério geográfico nunca nos deixa mal: ou seja, pelo sim pelo não, e à falta de alternativas, escolham uma boa zona...

quinta-feira, dezembro 30, 2004

Estatística

O contador, por via do chamado efeito Charlotte, registou nas últimas 24 horas a despropositada e disparatada soma de 422 páginas vistas e 186 visitas únicas. A gente, enfim, agradece. Mas há aqui, vejamos, um óbice estatístico: se é verdade que os sectários da Fénix se espalham pela orbe em número virtualmente infinito; e que por cada cultor da suprema Arte da laustríbia pululam, no mínimo, vinte e quatro gaioleiros no activo (perdão: no passivo); e que por cada gaioleiro se contam pelo menos uns seis ou sete arregaçadores da pívia automática - isto ontem deve ter andado mal frequentado como o caralho...

quarta-feira, dezembro 29, 2004

O filme

Charlotte, nos últimos tempos, acordou como Jamie-Lynn Sigler (a Meadow da série Sopranos), como Brooke Shields, como Elizabeth Taylor e como Anita Ekberg. Por aqui, na Seita de Fénix, como é que vemos o filme?

Vamos por partes: Jamie-Lynn é o sonho de qualquer piveteiro. Sobretudo do sectário daquela fase intermédia a quem o desejo chega em cascata, avassalador - mas não ainda o rigor, a pulsão, o domínio. Não admira: olha-se a mocinha e vê-se que tem o vício da mãe; mas menos pressa de regressar a casa, ignorante ainda da ideia de contrato social; e a salvo, portanto, do desassossego do sentimento de culpa. Depois o modo como ela nos olha: com aquela expressãozinha de quem lhe puxa a retoiça; o corpo ligeiramente dobrado numa pose de espera; as mãozinhas munificentes, dadivosas, laivosas. Aquilo, num rapaz ainda às voltas com a dermatologia, é pívia mais que de imediata - e desculpa-se: não quer dizer que o gaiato esteja perdido para a Arte - é só da idade.

Depois a Brooke Shields: ora aqui está um imbróglio: a rapariga é bonita; é sensual; tem uma boquinha apetitosa, de polpa saliente, equilibrada; uns olhos ligeiramente rasgados; falta-lhe o quê? Pois falta-lhe tudo: falta-lhe o sal e falta-lhe o carácter, a borga e a rareza, a singularidade e o bródio - enfim: falta-lhe estrangeirinha. A Brooke, sim, será o sonho dum putanheiro até à sétima casa que ande a pensar no desposório e à procura de mãe para os seus filhos; e o sonho, também, da mamã do putanheiro, a imaginá-la já nos serões do Inverno a discorrer filosoficamente sobre a destemperança e a perdição: «Fumar mata e, quando se morre, perdemos uma parte muito importante da nossa vida.» Agora de resto, não: aposta-se dobrado contra singelo em como não houve sectário que desse ao hidráulico a pensar na inocente: é que se olha o retrato da jovem, fecha-se os olhos - e o mais erótico que a gente lobriga é um padre ou uma sogra a atar-nos um lacinho na piroca.

Quanto à Elizabeth Taylor - está-se mesmo a ver: é o devaneio de qualquer gaioleiro que se preze; desses que nunca foram tocados verdadeiramente pelo desejo, mas apenas pelo estrago e pela depravação balofa; desses para quem são muito ténues as fronteiras entre foder e levar no cu; desses que, tendo passado directamente da fase da pívia para a da gaiola (ou nem tendo verdadeiramente chegado a esgarçar o mangalho, mas apenas a adular o ceguinho), celebram a lantejoula, a cintilação, a meiazinha de vidro, a celerada elegância dos «salões». A maior fantasia destes gaioleiros era uma indigitação para receber a Elisabet Taylor na sala VIP do aeroporto da Portela e levá-la a conhecer a cidade - os Jerónimos, o Tejo, Alfama, Madragoa– acabando a noite numa casa de fado castiço.

A Anita Ekberg - desculpem: o que seria de Fellini sem a Anita a mergulhar na fonte de Nicola Salvi? O que seria do mundo sem as suas mamas, a um tempo sobranceiras, afoitas, acomodadas, áticas? O que seria da Arte suprema do esgarçanço sem o seu olhar desprotegido, sem os seus olhos infinitos, sem os seus ombros nus? (S i l ê n c i o . . .)

segunda-feira, dezembro 27, 2004

O desejo

O piveteiro arreganha a carapuça movido pelo impulso instintivo do desejo: pertence à Seita de Fénix pela simples razão de que não fode, ou porque fode muito menos do que o instinto lhe pede. O sectário da Arte, por sua vez, coloca-se num plano superior em que o esgarçanço é já a procura e não a resposta. Quer dizer: não responde ao aguilhão do desejo; procura o desejo que há no desejo, como outros, ao longo da História, procuraram a santidade ou a sublimação.

Por isso tão frequentemente deparamos com o erro de pensar que «é a impossibilidade que desperta o desejo mais intenso». Pelo contrário: a impossibilidade deu, sim, gerações de paneleiragem e gaitada rasteira; muita gaiola; muita conice achocolatada; muito psicanalista rico; muito déspota em exercício de funções.

O desejo, ah, o desejo é outra coisa.

O espelho

Gosto sobretudo quando ele te toca e tu, de modo sub-reptício, me olhas.

Em ti

Quero-te inumeramente.

sexta-feira, dezembro 24, 2004

Festas, sim...

Numa altura como esta, numa quadra de paz, anjinhos pendurados no tecto da sala de jantar, missas do galo, amor e universal concórdia, uma questão se coloca: os cultores do Segredo (quer dizer: os susceptíveis à ideia de Pecado) devem ou não abdicar temporariamente da execução do rito? Exigindo-se uma resposta clara, diremos:

- sim: recomendaria a prudência que os sectários da pívia alimada, da gaiola decrépita, do arreganha-a-beiça e da conice estúrdia, por exemplo, se demitissem de excessos até, digamos, pelo menos ao dia seis de Janeiro;

- não: que a arte subtil do esgarçanço não merece censura nem mesmo, imagine-se, do Conselho Pontifício para a Família, quanto mais...

(Claro que há aqui um óbice aparente: a Igreja privilegia «o carácter esponsal do corpo» [e o esgarçanço, obviamente, fica aquém do enunciado]. Mas isso, digamos, é um fim: porque a própria castidade pode muito bem ser entendida como um estado transitório que termina exactamente no instante em que a foda é abençoada pelo sacramento – estão a ver?...)

Quanto ao resto, é o que se vê: ao Conselho Pontifício preocupa-o sobretudo a «aprendizagem do domínio de si»: ora outra coisa não ambiciona o esgarçanço...

No que respeita à punheta rasteira, claro que tropeça no requisito da «vulnerabilidade às influências emotivas» - ou «influxos negativos». Mas por essa gentinha da gaiatada já se sabe que não metemos as mãos no fogo em nenhuma circunstância...

Equívocos

Nós, graças a deus, estamos habituadinhos à metáfora, à perífrase, ao eufemismo, à sinédoque, à alegoria. Se pudermos dizer por meias palavras - melhor; se pudermos enrolar o discurso- melhor; se pudermos deixar a coisa em diluídas tintas - melhor; se nos pudermos ficar pela alusão – melhor ainda; se conseguirmos baralhar, confundir, ocultar – excelente. Está-nos no sangue.

Também por isso muitas discussões são ociosas quando o que nos move é mais a realidade concreta e corpórea das coisas (ai, ai, o corpórea...) e menos a filosofia, a retórica ou a dissertação.

A Seita de Fénix (como tantos outros grupos onde a ignorância, a xenofobia ou simplesmente a sobranceria moral deixou o seu ferro escarlate) conhece desde sempre estes equívocos de linguagem, a erosão das frases, o logro dos corredores dos labirintos. Mas até isso aprendeu a usar em proveito próprio (e por isso o Segredo e o esgarçanço se aproximam tanto nos seus pressupostos).

segunda-feira, dezembro 20, 2004

Népia

Vejam-se filmes, leiam-se romances, meta-se conversa nas reuniões sociais: o olho do cu e a masturbação é como se não existissem. Nada. Népia. Ora isto é como a gente estudar as antigas civilizações e recusar-se a reconhecer a existência do Crescente Fértil.

O tempo, 1

Claro que é isso que procuramos todos. Desde sempre: o instante que se multiplica indefinidamente, o instante que se repete apenas em si mesmo, o instante que não se repete senão nas suas próprias frases. Que outra coisa é, senão isso (senão essa procura infinita), a Arte sublime, subtil, do esgarçanço?

A Senhora de T. (cf. Milan Kundera, A Lentidão, ed. ASA, 1995) conhecia O Segredo (ela que, supostamente – embora não exista nenhuma descrição que nos possa confirmá-lo – teria uma conformação rotunda, já que «a rotundidade do corpo faz nascer a rotundidade e a lentidão dos movimentos e dos gestos»).

Ela sabia: que não há outro desígnio que o da procura do instante em que o mundo e o tempo deixam de coincidir.

O tempo, 2

«Porque lhe terá ela dito que não tinha a chave? Porque não lhe terá explicado logo que já ninguém fecha o pavilhão? É tudo preparado, fabricado, artificial, é tudo encenado, nada há que seja franco, ou, por outras palavras, tudo é arte; neste caso: arte de prolongar a suspensão do tempo, melhor ainda: arte de persistir o mais longamente possível no estado de excitação.»

[Milan Kundera, A Lentidão, ed. ASA, 1995]

O tempo, 3

«A jovem habita um quarto cuja porta dá para o corredor; mas, como é natural, a mãe tinha retirado a chave. Tratava-se apenas de a apanhar. Nada mais fácil para execução; bastava-me dispor dela durante duas horas e poderia ser dono de uma igual. Então, correspondências, entrevistas, encontros nocturnos, tudo se tornava cómodo e seguro: entretanto, poderíeis acreditá-lo?, a criança tímida recusou, com medo. Outro qualquer ficaria desolado; eu vi nisso apenas a ocasião de um prazer mais vivo. Escrevi a Danceny para me lamentar por essa recusa, e de tal modo que esse estouvado não teve descanso enquanto não obteve, tendo mesmo exigido, da sua receosa amada, que ela satisfizesse o meu pedido e se entregasse à minha discrição.»

[Choderlos de Laclos, Les Liaisons Dangereuses – in A Arte de Amar no Século XVIII, Editorial Inova, 1972]

O tempo, 4

«As cenas moderadas aborrecem-vos e eu, pelo meu lado, nunca tinha saboreado o prazer que experimento nestas pretensas lentidões.»

[Choderlos de Laclos, Les Liaisons Dangereuses – in A Arte de Amar no Século XVIII, Editorial Inova, 1972]

domingo, dezembro 19, 2004

Tu sabes

Estranho. Juro. Chego a acreditar que nunca partiste. Que todos os dias oiço os teus passos, vagarosos, leves, a atravessar o pátio. Que todos os dias a tua sombra se desenha na parede da sala, a meio da manhã, quando a luz do inverno, esta luz magoada, atravessa a janela e fica assim por instantes, meu amor, poisada nos teus ombros. É estranho. Juro. É como se nunca tivesses partido. Ou, enfim, como se regressasses todos os dias. Como se todos os dias, durante todo este tempo, nos tivéssemos tocado, como se todos os dias te tivesse fodido (e foder é dizer pouco - o esgarçanço é uma forma superior de amar; tu sabes). Por isso fico aterrorizado com o teu mail. Como é possível anunciares a tua chegada depois de «uma tão prolongada ausência» se, na verdade, não chegámos nunca a separar-nos? Eu tive-te sempre, meu amor, nas minhas mãos. Juro. Eu tive todos os dias nas minhas mãos o calor, a textura da tua pele (tu sabes).

sábado, dezembro 18, 2004

A gente bem quer ver se as encaminha...

Confesso que fiquei logo de pé atrás quando soube que a menina era muito lida no Chomsky. Enfim, um descalabro: só queria foder... Saíamos pela primeira vez, é verdade, e eu acreditava ter ainda tempo para a disciplinar um pouco. Um pouco hoje, um pouco no encontro seguinte – o tempo ensina-nos que as coisas, em havendo tempo, com o tempo vão. Qual quê? Levou-me logo ao apartamento (um apartamento reles, pomposo, com uma espécie de mantas mexicanas a fazer de cortinados e artesanato barato poisado nas estantezinhas de madeira tropical) e despiu-me com fúria (ela já estava quase despida no elevador, praticamente já só faltavam as cuecas – tirou-as mal deu a volta à chave por dentro). Pronto, querida, pronto, que não seja por isso (e até nem seria dos fretes piores, aqui pra nós, se a moça não guinchasse desalmadamente como se lhe faltasse o óleo nos amortecedores – porque não lhe faltava mais nada)... Pronto, pronto, que já tacalmas...

Deixámos o quarto (uf!), tirou do frigorífico uma garrafa de sumo cor de rosa, sentámo-nos num tapete colorido da sala (ela, meu deus, de roupão; o monograma com as inicias do nome...), aturei-lhe meia dúzia de enunciados teóricos sobre o cinismo global (salvo erro) e a gramática generativa não sei quê – e, como quem não quer a coisa, puxei a conversa ao terreiro da suprema Arte, embora já sem esperanças de que, nestas coisas do masturbo, alguma vez tivesse passado da fase piveteira de puxar o lustro à concertina. Pois a mocinha corou – inquieta, irrequieta, desassossegada, muito vermelha nas fauces... A mesma catraia que, com um à vontade impressionante, acabara de me pedir que lho encabasse no olho; a artista que guinchava sem pudor, cerrando os olhos com muita força a dilatar as narinas; pois esta mesma criatura ficava agora sem jeito porque o assunto não era (ah, já me lembro...) a teoria da gramática generativa transformacional mas, pasme-se, a masturbação, a Arte do esgarçanço, a laustríbia...

Estas estudantes de Letras, ui, ui, só sabem foder – haja quem as ature.

sexta-feira, dezembro 17, 2004

Médium

Ah, duvido, permitam-me duvidar que o Camilo fosse o fodilhão que dizem. Certo que o femeaço o deixava tolo. Certo que fodeu muito. Certo que levou pancada da grossa, de pau de marmeleiro ou de lódão, em quanta feira ou festividade religiosa frequentou no Minho e Trás-os-Montes - sempre muito atreito, o marmanjo, a desencaminhar as senhoras enquanto os maridos, inchados (é um supor - esta deu-se em Amarante) passeavam a cavalo ao som das cavalhadas do coração de Maria. Certo, muito certo. Mas a Camilo interessava-lhe, acima de tudo, a Suprema Arte do esgarçanço. Por isso seduzia (fodendo, claro, se necessário fosse para seduzir ou assim viesse de feitio): porque não é possível esgaramantear o mangalho quando não seduzimos, quando não sabemos, quando não temos a certeza que alguém nos deseja.

De resto, sabe-se o que Camilo Castelo Branco achava do contacto com um corpo, do asco que lhe produzia a materialidade rasteira dos corpos. E percebe-se, pois, que o usasse (ao feminino corpo) como meio, meio privilegiado, para arremangar a estultícia. Olhem só este excerto, vá, estejam atentos: «Sou tão avesso, e tamanho asco tenho a beijos, como aquele frade da mesa censória, que mandava riscar beijo, e escrever ósculo. Os teólogos casuístas, e nomeadamente S. Afonso Maria de Ligório, conjuram unânimes contra o beijo, inscrevendo-o no catálogo das desonestidades. Não digo tanto. Entendo que beijo pode ser acto inocente, mas não pode ser nunca limpo e asseado. É um contacto de extrema materialidade, com toda a sua grosseria corpórea» (cf. Memórias do Cárcere, Publicações Europa-América, s/d).

Ah, pois é... Descansem que não deixaremos de nos vir aqui com mais, com bastos exemplos da tese...

quinta-feira, dezembro 16, 2004

Um blog decente

Sim, é verdade, cedemos à tentação de escrever sobre a situação actual da nossa vida política . Sim, por pudor.

Elas

Ouves por acaso. O grupo é pequeno, íntimo, sim, de amigos comuns. E percebes que elas, sentadas perto de ti, falam de sexo. Uma com a outra, confidentes. Ouves, portanto, partes da conversa. Aguças o ouvido, inclinas-te, displicente, no sofá. O assunto interessa-te. Uma explica que «estava deitada, com ele entre as pernas»; a outra pergunta-lhe se não prefere «de pé, movendo os quadris até senti-lo a roçar o clitóris». Estás na fase tardia da pívia, divides-te entre guardar-te para o arregaçanço ou avançar, audaz, confiante, como quem diz: «elas querem é peso». Só depois compreendes que falavam duma almofada. Que também elas pertencem à Seita de Fénix, mas que começam já a discutir as subtilezas da Arte. Que, não tarda, a almofada não será necessária. Que lhes bastará poisar a mão, muito aberta, muito levemente, sobre as coxas. E depois deixá-la (a mão) ligeiramente afastada. Sentindo essa espécie de lume vagaroso, exíguo, exausto, até à loucura e à consciência do torpor e do milagre. Saberás então (intuis) que és tu exactamente quem menos interessa ao assunto. Que nem reparam que estás presente, incomodado, a coçar os tomates. És novo, enfim, talvez não estejas ainda perdido de todo para a suprema Causa.

quarta-feira, dezembro 15, 2004

As Áditas

As cultoras do Segredo pululam na orbe. Duplamente perseguidas, refinaram códigos, privilegiaram o método e a disciplina, a circunspecção, o enredo, o ardil. Algumas - nomeadamente as Áditas, descendentes de perdidas tribos cuja origem remonta à época da sagrada Arca - reconhecem-se (entre elas) à distância: por um modo especial de moverem os olhos, por um avisado gesto, por uma subtil modulação da voz. E até isso – o reconhecimento de uma igual nas subtilezas da Arte – chega a excitá-las.

O culto

As sectárias, essas que aspiram à subtileza da Arte, cultivam a altivez e a sobranceria.

terça-feira, dezembro 14, 2004

As «faz-mas»

Em comentário ao post anterior, para-raios interroga-se sobre se «uma outra mão, macia, quente, e bem orientada não pode ajudar».

Há aqui, meu caro, um problema conceptual: porque a verdadeira Arte do Segredo aspira à perfeição: e a matéria – o seu peso – costuma constituir-se como um obstáculo. Claro que o piveteiro, se lhas fizerem, chama-lhes um figo; claro que o gaioleiro, se lhas arregaçarem, até se passa (sendo certo que também não excluiu fazê-las a terceiros): mas, por favor, aqui preocupa-nos a Arte – deixemo-nos de paneleirices...

Já se disse que quem não fode não esgarça. Compreende-se, portanto, que ao sectário da suprema Arte, conhecendo tudo o mais, não lhe seja estranha a experiência da mão alheia: são as chamadas «faz-mas». Mas as «faz-mas» (lá está...) trazem na literatura inclusa (cf. capítulo das contra-indicações ) os mesmos óbices da foda: e o menor não será o de estarmos sempre sujeitos a uma unha do pé cortada em diagonal, a um joanete, a ter que lhes aturar os gemidos azeiteiros ou a ouvi-las dissertar sobre o amor, a resvaladice putéfia ou a conice das promessas de fidelidade imperecível (sim, filha, já tatendo...).

Portanto, é assim: uma «faz-ma», lá de tempos a tempos, vai; e às vezes, diga-se em crédito da verdade, até há lugar a boas surpresas. Agora não é o mesmo que ter a mocinha nos nossos próprios dedos, inteira, e sabermos de ciência certa que não tem a mínima hipótese de nos foder a mioleira.

Regra

Na Arte do esgarçanço há uma regra que não deve nunca ser desvirtuada: cada um fazê-la com a mão sua.

P.S. Quer dizer: ora aí está mais um bom motivo de conversa...

Leveza

De todas as situações descritas por Kundera para demonstrar a complexidade das coisas do amor (cf. A Insustentável Leveza do Ser) , nenhuma nos comove tanto como a do encontro de Tereza e Sabina: olhando-se, nuas, há um instante em que o desejo as percorre de um modo irreprimível. Em boa verdade, o desejo chega-lhes por interposta pessoa: Tomas, o amante ausente. Eis, pois, uma sublime metáfora sobre a Arte do esgarçanço (sendo certo que não chegam a tocar-se uma à outra, e nenhuma a si mesma): o desejo não é perturbado pela presença material, física, concreta, do corpo que se deseja; e, portanto, permanece imune a esse peso contrário, digamos, à leveza do Ser.

domingo, dezembro 05, 2004

Mais correio atrasado

Pergunta a sibylla, na caixa de comentários, que expressão usar em vez de «fazer amor». Assim muito rapidamente, aí vão algumas sugestões:

- se for do CDS-PP: procriar («amor, vamos procriar um filho») - pois esta gente só fode com o intuito da perpetuação da espécie...
- se for do PS, linha guterrista/socrática: empatar («olha, filho, vamos empatar um bocado») - pois esta gente nem fode nem sai de cima...
- se for do PSD, linha santanista: foder («querida, e se fôssemos foder esta merda toda?») - porque esta gente fode tudo, até o regime, se mal nos precatamos...
- se for do Bloco: complexar («e se nós os seis fôssemos complexar uma cena?») - porque esta gente conhece tudo, menos aquela coisa estranha em que uma mulher se estende de costas e um homem lho arruma deitado por cima...
- se for do PC, linha chefe Jerónimo: autoquiriar («camarada, e se fôssemos rebolar mais uma autoquíria?») - porque esta gente não descansa enquanto não se foder a si mesma...

E pronto, sibylla: não é muito, mas sempre é uma ajuda, não acha?

Desagravo

«Fazer amor» é uma expressão lamentável. Um bocadinho de periferia. Um bocadinho de classe média. Um bocadinho de quem se revê nos programas de recuperação da economia portuguesa, no dr. Cadilhe, na reforma do sistema educativo, na necessidade de privilegiar o cluster do turismo e do lazer. Esta gentinha «faz amor» com o mesmo desvelo, o mesmo empenho e o mesmo cuidado com que dobra o guardanapo depois do jantar de apoio e desagravo a Valentim Loureiro ou (não tarda) a Catalina Pestana.

Como se nunca

O esgarçanço e a foda não se complementam nem se excluem: são coisas diferentes. Bem certo é que quem não fode não esgarça. Mas quem não esgarça, em boa verdade, ou nunca fodeu ou é como se nunca tivesse fodido...

sexta-feira, dezembro 03, 2004

Algum correio atrasado

ver comentários ao post anterior

Luci: Não leia em sentido literal: o cultor da suprema Arte não apenas sabe que nem todas as mulheres lhe pertencem, como o que menos deseja é isso mesmo (cruzes!): o que verdadeiramente lhe interessa é saber que «é como se todas lhe pertencessem». Está a ver a diferença? Sim, é subtil, mas o ergançanço também não é nenhuma gaiatada - a gente não anda aqui a esfolar o ceguinho à mor das cuecas da monitora do centro de alojamento roubadas à noite da corda da roupa.

Informaníaca: Saberá no que deram séculos de ensinamentos baseados em leituras enviesadas do Livro Sagrado: gaiatada (paneleiragem, pívia, gaiola)... Pois muito bem sei eu o quanto muitos, treslendo Mateus, desejariam ver-nos livres de ser livres («jóbem, sssxede à tentasssxão da carne; e sssxela for muinta, nunca aprosssximes as mãosss das partes baitchas, ou intão ata um barasssxinho na gaita»). Também me poderia ter citado os Provérbios: «a estultícia está ligada ao coração da criança, mas a vara castigadora a afastará dela». Responder-lhe-ia com um segredo: o cultor da suprema Arte adora arremangar a estultícia...

quinta-feira, dezembro 02, 2004

Impossibilidade

A Seita dos Trinta Dinheiros (cf. Jorge Luís Borges, O Livro de Areia) considera iniludível que «quem olha uma mulher, para cobiçá-la, já com ela praticou o adultério no seu coração», concluindo que dificilmente será encontrado à face da terra um único homem que, em consequência, não tenha praticado o adultério (desde logo, no entendimento de que «o desejo não é menos culposo que o acto»). Esta posição coloca questões de ordem moral não irrelevantes.

Seja como for, para os cultores do Segredo - que executam o rito numa apaziguada relação com o desejo – esta discussão parece ociosa (exceptuemos os piveteiros, que arregaçam a piroca numa pulsão a que as ideias de pecado ou iniquidade se encontram sempre subjacentes, e os gaioleiros, para quem o delito ou a delinquência são inerentes ao seu labor tão próximo da ruína e da decrepitude).

Em rigor, o verdadeiro sectário desenferruja a bazuca no entendimento de que todas as mulheres lhe pertencem. Cometer adultério através da laustríbia resulta, pois, numa impossibilidade prática.